O Pastor Aprovado – Richard Baxter
Destacarei em breves linhas as partes do livro
que mais falaram comigo a cerca desse chamado tão importante e essencial, e que
ao mesmo tempo é tão difícil e laborioso. Como bem abordado no livro, ser
pastor vai muito além de abrir a bíblia e começar e declinar sobre os textos
contidos nela, vai muito além de visitar os doentes e desanimados e vai muito
além das quatro paredes de um templo. O livro trouxe-me uma percepção muito
maior do grande ofício que o Senhor deixou para seus servos, o de apascentar suas
ovelhas, como o Mestre orienta a Pedro em João 21:15-17. Pastorear requer devoção,
intimidade com Deus, zelo pelo rebanho que lhe foi confiado e certeza de que
sozinho não se faz nada.
Assim, abordarei alguns destaques brevemente,
pois, meu desejo enquanto lia, era de sublinhar toda a obra de tão rica e atual
que ela é, mesmo se tratando de uma literatura do século 17.
“Desistir
dos nossos irmãos e colegas é um mal sem remédio; é um erro.”
Já no primeiro capítulo essa frase diz muito
sobre o tempo atual em que vivemos, em nossa sociedade e cada vez mais comum a política
do descartável. Tudo é tão facilmente substituído que não nos preocupamos, por
vezes, em preservar o que temos. A desistência tem sido cada vez mais precoce, podemos
ver isso em casamentos, empregos e na igreja. Não se investe em salvar quase
nada, pois é muito mais fácil abandonar e buscar um novo. É como se após sujar
uma peça de roupa, ao invés de lavá-la se preferisse comprar uma nova. Por isso
achei muito interessante o conselho aos pastores em não desistir de suas
ovelhas, não buscarem apenas o seu próprio bem, mas o bem comum em prol de
todos.
“...alguns
deles lhes falarão de novos profetas e novas revelações, e outros lhes dirão
que estão perplexos, não sabem no que crer, não tem religião e, certamente, não
são cristãos”
Ainda no primeiro capítulo, agora voltado para o
“leitor leigo” Baxter traz um ponto de suma importância. Cada vez mais tem
surgido novas religiões ou grupos com novas doutrinas e práticas. Cada vez
menos vemos pessoas comprometidas em ler e estudar a Palavra do Senhor, e isso
faz com que surjam divisões e confusões no seio da igreja. Um dos pontos
clamados na Reforma Protestante era o de Sola
Scriptura, voltar para e somente as Sagradas Escrituras como livro de fé e
prática. A abordagem de Braxter nos faz abrir os olhos em um ponto central, nosso
guia aqui na terra deixado pelo Senhor é a Bíblia. Muitos dos chamados “desigrejados”
atribuem a dificuldade de escolher uma igreja, como sendo um dos fatores de não
fazerem parte de nenhuma, já que existe uma gama de igrejas com dogmas e costumes
diferentes. Somente conhecendo a verdade é que se pode conhecer o verdadeiro
Deus, e essa verdade é Sua Palavra.
“É
nosso dever ajudar outros a alcançar a glória eterna.”
No segundo capítulo, quando começa o seu
segundo tópico logo nos deparamos com uma frase curta e direta. Como
embaixadores de Deus aqui na terra (2Cr 5:20) temos o dever de representamos
Cristo enquanto aqui estivermos, e temos que seguir sua ordem de fazer discípulos.
A caminhada cristã é dura e árdua, pois peregrinamos em um mundo hostil e
necessitamos tanto de ajudar aos outros, como também ser ajudados. Não atoa o
sábio Salomão escreveu que é melhor que sejam dois que um, e que um cordão de
três dobras não se rompe com facilidade (Ec 4:9-12).
“Ora,
se Deus pôs para fora um anjo orgulhoso, tampouco tolerará um pregador
orgulhoso. Na verdade, o orgulho está na raiz de todos os outros pecados: a
inveja, o espírito belicoso, o descontentamento e todos os obstáculos que
impedem a renovação espiritual.”
Um mau terrível que sabiamente é abordado no
livro é o orgulho. Um coração orgulhoso se torna inflexível e doente. Todo que
deixa esse mau entrar em sua vida, está propenso a não perdoar, não ouvir
conselhos e a causar brigas e intrigas. Imagina um pastor orgulhoso, o terrível
mau que isso acarretaria em uma comunidade cristã. No filme O advogado do
diabo, uma das falas mais famosas da trama é dita pelo ator que representa a
figura diabólica: Vaidade, meu pecado favorito. O orgulho traz consigo uma
imensa vaidade, não deixa que se volte atrás e se arrependa ou que se retrate.
O orgulho é um câncer avançado, que se não tratado gera morte. Como servos de
Deus, devemos morrer para a velha vida e renascer para uma nova em Cristo
Jesus, nessa nova vida não há espaço para orgulho.
“Quão
trágico é que alguns estraçalham seus irmãos como hereges, sem nenhum esforço
anterior para compreendê-los! [...] Em vez brigarmos com nossos irmãos,
cooperemos todos contra os nossos verdadeiros adversários comuns.”
Sempre existirá controvérsia, seja na igreja ou
em qualquer outra área da vida. Muito me entristeço com brigas tolas entre irmãos,
que muitas vezes são por motivos tão banais e pequenos. O livro vai destacar a importância
da união dos ministros para que se preserve a unidade na igreja. Uns são calvinistas,
outros arminianos e outros zwinglianos. Cada pessoa tem seu estilo e gosto e
isso não significa que um esteja errado e o outro certo, até por que esse não é
um fator determinante para a salvação. Como abordado anteriormente por Baxter,
nosso livro base é a Bíblia, ela é nosso guia. Enquanto não entendermos que
nossa luta não é contra carne ou sangue, mas sim contra os principados e
potestades, nunca enxergaremos o nosso inimigo comum. Jesus vai dizer que uma
casa que se divide contra si mesma não pode subsistir. Por isso é vital o amor
e a compressão, a harmonia além de importante serve de testemunho para os não
cristãos, como pregaremos o amor ao próximo se não conseguimos viver em união
entre os nossos?
“Muitos
alfaiates podem andar de trapos, enquanto confeccionam roupas caras para os
outros.”
O capítulo três aborda um ponto importante, o
cuidado de nós mesmos. Confesso que é a parte que mais me impactou em toda a
obra. Nada que pregamos e aconselhamos terá validade se nosso testemunho for a
antítese de nossa fala. Como pode uma pessoa exigir santidade sendo devassa? Ou
exigir pontualidade se sempre se atrasa? Existe uma lupa diária sobre todos os
que escolhem uma vida de santidade em Cristo. Esse capítulo nos alerta para não
convivermos com os pecados pelos quais pregamos contra. Infelizmente já
presenciei pastores que no púlpito pregavam uma coisa, e na prática suas atitudes
eram opostas à sua própria pregação. Uma frase conhecida de Francisco de Assis é:
Pregue o evangelho, se preciso use palavras. Não que eu concorde totalmente,
pois a palavra deve sempre ser anunciada, mas não posso negar que nossas
atitudes e vida nossa cotidiana também são uma forma de evangelizar.
“Coisa
horrenda é os homens se atreverem tão pecaminosamente a extinguir o Espírito
com tal ociosidade e, depois pretextarem que é o Espírito que o está fazendo!
[...] Portanto, irmãos, não percamos tempo: estudemos e oremos, palestremos e
pratiquemos. Com estes quatro meios as nossas capacidades aumentarão”
Ainda no capítulo três, Baxter exorta ao
preparo e a dedicação ao estudo diligente. Um ministro do Senhor não pode achar
que Deus enviará anjos durante a noite que irá revelar tudo o que ele precisa
dizer e fazer. Uma frase de Calvino que gosto muito é: Orare et labutare. A oração é vital para um cristão, mas junto também
deve vir o trabalho e a ação. Se Deus tivesse de revelar tudo ao pastor então pra
que a Bíblia? Se ele revela tudo a todos então para que pastor para instruir? Não
podemos negligenciar ao estudo árduo da Palavra e ao preparo constante para o
ministério. Satanás tem milênios de anos de muito preparo e dedicação em destruir
vidas, nós não podemos cessar em buscar mais e mais de Deus. Nunca o
conhecimento de Deus e suas obras se esgotará, ninguém sabe tanto que não possa
aprender mais. A orientação de Oséias é de conhecer e prosseguir em conhecer ao
Senhor (Os 6:3).
“O
diabo é muito maior erudito que vocês. [...] A isca, pois, que ele usa é sempre
própria para o temperamento e a disposição de caráter de cada um de vocês.”
Uma das orientações bíblias é para que
resistamos ao diabo para que ele fuja de nós. Não podemos menosprezar a força
que o diabo pode levantar e desferir contra nossas vidas, por isso é de suma importância
nos revestirmos de toda a armadura espiritual de Deus e estarmos sempre vigilantes
para não sermos tragados. Todos que pescam sabem que para cada tipo de peixe se
usa uma isca e para cada tipo de água um equipamento. Assim é com cada prego
que sobressai a madeira, a tendência é ser martelado. Baxter alerta para o fato
de satanás usar de grande astúcia contra todos que se dispõem em viver para se
opor as obras do maligno. Jesus foi prova disso, ele padeceu e sofreu por nós e
nos garantiu a vitória, e o preço foi altíssimo. Não podemos dar lugar ao
inimigo de nossas almas e permitir que ele tente manchar a sagrada igreja de
Jesus, através de nós.
“Gostamos
da pessoa que reitera o que dizemos, que concorda com a nossa opinião e que
promove a nossa reputação. Mas achamos ingrata quando ela nos contradiz, diverge
de nós, fala com franqueza conosco sobre os nossos erros e nos aponta as nossas
faltas.”
Em geral, gostamos de receber elogios e
tapinhas nas costas, mas nos sentimos irritados e irados se nos deparamos com ideias
contrárias as nossas. No quarto capítulo, Baxter ressalta que o pastor também
pode errar e se isso acontecer é necessário arrepender-se e humilhar-se perante
Deus. Baxter vai ressaltar que muitas vezes queremos ver lágrimas de
arrependimento nos outros, enquanto nossos próprios olhos estão secos. Lidar
com a controvérsia faz parte, a crítica construtiva tende a produzir
crescimento. Ninguém sozinho é dono da razão, e precisamos ter humildade caso
venhamos a ser repreendidos em alguma falta. Hoje em nosso tempo temos visto
cada vez mais pessoas sensíveis a tudo, não atoa muitas igrejas optaram por não
mais pregar sobre pecado, para não correrem o risco de magoar alguém e diminuir
seu público. Algo que vai totalmente contra os ensinamentos bíblicos que nos ensinam
a não compactuar com nenhum tipo de pecado, mesmo que isso magoe ou entristeça alguém.
Se de fato temos errado é necessário o arrependimento legítimo, para que nosso
pecado seja perdoado por nosso Deus e para vivermos uma vida de retidão diante Dele.
“Todos
os cristãos são discípulos ou alunos de Cristo, e a Igreja é Sua escola. Nós
somos os Seus atendentes. A Bíblia é Seu livro-texto. E é isso que devemos
estar ensinando diariamente aos que estão aos nossos cuidados.”
No quinto capítulo Baxter vai abordar sobre o
cuidado do rebanho, ou seja, das pessoas que o Senhor confiou nas mãos do
ministro. Cristo é o cabeça da igreja, e isso nunca pode ser esquecido nem por
um minuto. Muitos líderes perderam essa essência, que a igreja tem um dono,
Jesus. Uma igreja deve ser Cristocêntrica e a Bíblia a base de todas os
ensinamentos. Todos nós somos discípulos de nosso Senhor e como tais devemos
conhecer cada vez mais nosso Deus e Sua Palavra. Como conheceremos as maravilhas que Deus fez
na vida de seu povo, como conheceremos os milagres, como iremos saber do
sacrifício vicário de Cristo se não lermos as Escrituras, e como o mundo saberá
se não anunciarmos?
“Assim,
toda vez que olharmos para os que se congregam em nossas igrejas, lembremos
vividamente que eles são aquisição feita pelo sangue de Cristo.”
Esse ponto abordado no sexto capítulo é para
fazer qualquer um tremer diante de Deus. As vidas que estão congregando e que
foram resgatadas do lamaçal do pecado, foram compradas por um alto preço. Nunca
que sozinhos conseguiríamos quitar nosso débito diante de Deus. Nunca um líder
pode menosprezar o que Jesus teve de passar na cruz para que o céu fosse ricamente
povoado, e jamais pode ele cogitar a possibilidade de ter sido seu próprio esforço
ou grande eloquência que fez com vidas se convertessem e viessem a Cristo. Um grande
orador sem a ação do Espírito Santo, não e nada além de um grande orador, mas quando
tem o auxílio do Espírito se transforma em um profeta de Deus para resgatar vidas.
Somente o Espírito consegue convencer o homem do pecado, da justiça e do juízo
e somente o sangue de Jesus consegue purificar de todo o mal. Baxter vai dizer
que vergonhoso será o dia final para o pastor que negligenciou o sangue de
Cristo.
“Se
acharem que ele é interesseiro ou hipócrita, ou mesmo uma pessoa que não cumpre
o que diz, desconfiarão de tudo o que fizer por eles.”
Mais uma vez Baxter ressalta a importância do
exemplo, aqui já próximo do final de sua obra no capítulo oito, quando trata da
eficácia da obra pastoral, Baxter deixa claro que é vital o pastor transmitir a
sua igreja credibilidade. Isso com o propósito de aceitarem seus conselhos e
exortações. Infelizmente muitos escândalos dentro da igreja tem afastado muitas
pessoas de Cristo. Conheço diversas pessoas que não gostam de igreja por presenciarem
maus exemplos praticados por membros e por líderes. Pastores gananciosos que exploram
pessoas e não cuidam dessas mesmas. Uma grande mancha que vejo no chamado
pastoral e muito por conta dos chamados “pastores de televisão” que com seus
programas no ar 24h por dia pregando mensagens de prosperidade e mercadejando a
fé. Cada dia surge um novo produto consagrado que faz milagres a disposição de
quem possa pagar para obtê-lo. Tenho plena convicção que nada difere estes
líderes dos mesmos que foram expulsos por Jesus do templo, esses que tem transformando
a casa de Deus em um mercado.
“É
vital que nos preparemos para o púlpito, e, portanto, com oração praticada privadamente.
Demonstrem claramente o seu amoroso interesse pelas almas do seu povo.”
Aqui pude observar a total oposição ao último tópico
abordado. Quando um ministro de Deus tem amor pela obra e pelo seu rebanho ele tem
uma vida de preparo e de oração. Seu interesse não é pelas posses ou bens de
seu povo, mas por suas vidas. Vejo que mesmo em meio a tantos falsos mestres e
tantos interesseiros, Deus preserva sempre um remanescente fiel. Sempre que me
encontro desanimado e cansado, quando penso em desistir e não vejo esperança de
vivenciar um tempo onde se prime pela Palavra, onde se encontra um povo com
sede de Deus. Então, lembro-me de Elias conversando com Deus. O profeta que se
encontrava desanimado e com medo é encorajado por Deus, sete mil homens não se
renderam a Baal. Deus ao longo de toda a história tem preservado joelhos que
não se dobram as mazelas deste mundo, e bocas que continuamente engrandecem o Seu
nome. Creio que ainda existem homens e mulheres fiéis ao Senhor que buscam de
todo o coração anunciar ao mundo as boas novas da salvação.
“Ora,
Deus não entrega dons aos homens para serem enterrados, mas para o uso comum da
igreja.”
Um talento não pode ser enterrado, mas
utilizado para o louvor de Deus e edificação da igreja. Noto que em geral, nas
igrejas poucos fazem muito. Se fosse o contrário, se muitos fizessem um pouco,
muito mais edificada seria a igreja e mais leve seriam os fardos. É importante
ao líder saber identificar os dons e talentos de seus liderados e ajuda-los a
desenvolver esses dons. Muitas pessoas se acham incapazes de ajudar na obra por
não acreditarem que podem de alguma forma colaborar, ou por pensarem que
somente quem prega e canta tem valor. Em um dia de sol escaldante alguém que
fornece um simples copo d’água pode abençoar muito uma pessoa. Creio que o mesmo
Deus que nos chama também nos capacita, cabe a nós nos disponibilizarmos para
obra.
O livro O Pastor Aprovado de Richard Baxter é sem
dúvida uma obra que deve ser lida por todos que tem em seu coração o desejo de
cuidar de vidas. Todos que tem um chamado pastoral deveria ler e meditar nas
orientações que Baxter descreve no livro. Nota-se que não é nada fácil lidar
com pessoas diferentes, com visões distintas, temperamentos particulares e ainda
ter a responsabilidade de liderar todas essas pessoas de forma harmoniosa e
paciente. Ser pastor vai muito além de pregar em um púlpito, pastorear é guiar,
aconselhar, amar, viver junto e ao final da caminhada entregar todas as ovelhas
ao grande Pastor de quem elas pertencem.
Essa obra muito edificou a minha vida e caso um
dia Deus me chame a pastorear, pretendo ler novamente para sempre buscar ser um
líder aprovado por Deus e pela igreja.
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